O fim de uma era

Eu tenho um pouco de receio em registrar este fato, mas após a última soneca estou confiante. Vou relatar, portanto.

Luiza mamou (assim, no passado) por 2 anos, um mês e 20 e poucos dias. Esse negóz de livre demanda a gente já abandonou faz um bom tempinho. Dias antes de virmos pra Berlim, entretanto, ela resolveu se comportar como um recém nascido e mamar loucamente e absurdamente. O vôo pra cá foi enlouquecedor, ela plugou no meu peito e terminou quando pousamos. Eu só pensava que vida linda deve ter aquela mãe que tava dando mamadeira pro filho na poltrona do lado.

Eu estava exausta.

Sim, amamentar é uma dádiva. Nada se compara aos benefícios para a criança, a OMS recomenda a amamentação até os 2 anos, bla bla bla. Sou defensora do leite materno, sou orgulhosa por ter chegado onde cheguei, tenho muita sorte por ter apoio e por conseguinte não ter desistido.

Mas eu estava exausta.

Daquele vôo até a semana passada passamos por 3 ou 4 resfriados. Por pior que parecessem todos eles saravam completamente em 2 ou 3 dias, acredito que por conta do “mamá”. Tenho uma mocinha que nunca arrancou meu peito pra fora, ou deu escândalo pra mamar fora do horário ou lugar combinado, desde que começamos a ter esses padrões. Tenho um anjinho e tenho sorte.

Sim, mesmo assim eu estava exausta.

Há mais ou menos três semanas eu estive numa conversa com uma amiga e mencionei como eu estava esperando ela se adaptar no Kita e o inverno acabar pra tirar o mamá. A Luiza aparentemente estava brincando com as amiguinhas na minha frente… mas ela ouviu, interpretou e, assim que chegamos em casa, as próximas 12 vezes que eu disse a palavra “Kita” eu recebia a resposta agressiva “EU QUELO MAMÁ!” – com uma cara superbrava.

Eu sentei ela comigo, expliquei que a gente ia pro Kita, mas quando chegasse ia ter mamá, e que a mamãe não ia parar de dar hoje. E pensei: ok, ela vai mamar até os oito anos. Desde então, cada vez que ela pedia pra mamar a noite eu negava uma vez e dava na próxima.

Daí quatro dias atrás ela acordou e mamou. Como sempre. Mamou pra tirar a soneca da tarde. Só que naquele dia ela mamou 3 vezes e não dormiu… Eu simplesmente disse que tinha acabado. Ela disse algumas vezes “eu quelo mamá não”, sendo esse “não” providencialmente adicionado quando ela se lembrava que não tem mais.

Nas últimas noites e sonecas da tarde eu tenho apresentado pra elas as rotinas de soninho que as outras crianças tem: lemos, vimos desenho, cantamos e contamos histórias. Ela adora as histórias. As vezes ela acrescenta um detalhe vindo diretamente da cabecinha dela. Exemplo fofo:

(…)”e ficavam olhando pras estrelas, láaa no céu”… e ela apontando os dedinhos em movimentos circulares pra cima “e a nuuuuuuvens, e a luuuuuua”(…)

Uma falação sem fim compactadas em menos de 10 kg de fofura extrema.

Pra não dizer que ela não pediu mais, nas últimas 3 noites, sempre perto das 5h00, ela resmunga e pede… mas eu falo “lembra que acabou?” e ela já emenda “quelo hitólia, mamãe”. E às 5h00 da manhã, babando de sono eu balbucio “era uma vez” seguido de qualquer outra coisa. Em 50 segundos ela dorme. E isso se repete por 2 ou 3 vezes antes de acordar pra valer.

É o fim de uma era. Ainda não senti falta, se é que sentirei. Por agora só orgulho de nós e a ansiedade pelo fim do despertar desorientado das 5 da manhã.

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25 meses e 19 dias

Faz 3 dias que Luiza fala “a mamãe não levou a Luiza no parquinho” vez por outra.

Hoje ela acordou da soneca e eu perguntei se ela queria ir, ela disse que não. Mencionei uns 3 diferentes. Nada.

Daí pergunto se ela quer ir na piscina, ela topa. Fomos, nos divertimos um monte, ela tomou dois caldos sem chorar, correu, pulou na água trocentas vezes, atravessou a piscina sozinha, até que pediu pra ir embora.

De lá fomos no mercado, que é quase de frente – e que ela adora. Levou bichinho, perdeu, achou, comeu, cantou, pediu guloseimas, disse “obaaaa” mil vezes.

Do mercado pra casa passamos no banco. Lá ela disse que queria brincar no iPad quando chegasse. Chegando em casa ela comeu mais, brincou no iPad, disse “eu te amo auau” pro cachorro do Playkids. Pediu pra dormir rapidinho.

Enquanto visto o pijama, pouco antes de dormir ela olha pra mim e diz: “mamãe não levou a Luiza no parquinho”

Fim.

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Pra lembrar

Ainda sobre a conversa desconexa da Luiza antes de dormir: Ontem ela gritou MACACO, MACACO, MACACO, MACACOW, QUERO MAMAR MAMÃE, e eu caí na risada… Agora ela disse “ali mamãe, Berlim! O Berlim, o Berlim!!!” Apontando com o dedinho pro teto. Sempre de olhos fechados. Adoro.

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Que rotina?

Nos últimos anos, se você é minimamente ligado no tema já teve acesso a algumas dezenas de artigos que tratam da culpa materna. Há um crescente movimento contra a romantização maternidade e da gestação. Um Viva a estes processos, porque a gente não merece passar a vida achando que é a única mãe imperfeita do mundo.

Aqui, em meio a uma fofura sem fim e meu eterno encantamento pelo desenvolvimento da pequena, eu tenho sofrido diariamente – e excessivamente – pelo fato dela não estar conseguindo entender a rotina. Estamos na seqüência mudança de casa > mudança de país > sol se pondo antes das 16h > dois anos > escola nova (eu já li sobre uma fase de regressão do padrão de sono aos dois anos, me apeguei ao motivo).

Tô careca de saber que passa. Mas tá sendo duro botar ela pra dormir 2-4 vezes por noite, sempre bem depois das benditas 21h, que foi o horário dela literalmente desde o dia que nasceu.

Fico zonza de tensão conforme as horas da soneca da tarde vão passando. Quando ela acorda e vê que está escuro lá fora é um sacrifício fazê-la entender que ainda não é hora de dormir. Junta tudo isso com o apreço ao “eu não quelo” dos últimos dias… É dureza.

Como mencionei no último post, sou boa em relativizar os sentimentos, então tenho me policiado pra tentar suavizar o meu desespero, hahaha. Mas é difícil e, apesar de estar curtindo a temperatura, o aprendizado e cuidando de tudo pro inverno ser mais suave, eu estou contando os dias pro solstício.

Eu parei há alguns anos de encarar a virada do ano como um recomeço, mas saber que a partir do Natal nossos dias voltam a ser maiores me faz desejar 2017 todos os dias.

Continuo a nadar.

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Evoluindo

Eu tô aqui num dia leve, sem muita coisa na cabeça, tive tempo de estudar, mas aí veio um papo com marido sobre o fato da Luiza ter aparentado estar com saudade dos avós um dia desses.

Eu acho que a forma dela construir a própria relação com a saudade será diferente de tudo o que a gente sente atualmente. Se os prós de estarmos aqui não fossem maiores que esse “pequeno” fato dela crescer longe da família nós não estaríamos aqui. E não estaríamos confiantes e determinados com nossa escolha. Não me preocupo. Acho que as férias no Brasil serão sensacionais. E acho que ela vai chorar no fim assim como eu chorava pra ir embora do Carmo do Paranaíba, onde passava tempo com os primos e tudo era festa.

Daí eu penso em mim, na minha saudade, no meu sofrimento – aquele que eu já mencionei que eu despacho rapidinho. Poucas coisas me causam o buraco no peito que sinto quando vejo foto ou vídeo da Luiza com o Gabriel na chácara da minha mãe. Bu-ra-co. É duro ver que aquilo não tem data pra acontecer de novo, e como estarão grandes quando acontecer.

Ainda bem que por aqui as coisas estão evoluindo, que a pequena gosta da escola, que a matéria no curso de alemão hoje fez algum sentido e que o frio de -5°C ainda me parece gostosinho.

Relativizar sentimentos é uma arte.

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Lidl, parquinho, domingo

Luiza descabelada de pijama e carinha de sono, recém acordada:
– filha, sabe onde a mamãe quer ir hoje?
– no Lidl (um dos mercados aqui perto)
– não filha, hoje é domingo, o Lidl está fechado.
– domingo (seríssima)
– sim, hoje é domingo, mamãe quer ir pro par…
– qui-nhooooooo!
– isso, hoje é domingo e mamãe vai pro parquinho
– mamãe vai pro domingo e vai pro parquinho
– hoje é domingo e a gente vai pro parquinho
– a gente vai pro domingo, mamãe!

Introdução aos dias da semana com a mini pessoa que adora palavras novas.

Aprendiz
Essa semana a Telesão virou “Pelevi-são”
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Monólogos

Acordou faz uns 20 min e não parou de falar/cantar um instante. Dentre as pérolas:
“O Papai não tem mamá”
“A cabana chama o castelo”
“Mamãe, acho que a zebra voou”
“Oooolha! Um monte de azul! Azul é blau blau blau”
“Cadê o Papai?” (Foi pra aula)
“Eu tô sem Papai!!” (Abrindo os braços com as palmas da mão pra cima forjando um desespero)
“galinha, o Papai vai voltando”
“Eu quelo pizza de prato roxo”
“A mamãe é muito grande”
Sobe na cama, vai até a beirada e diz “como que você desce agora?”
“Deixei a amalela na cadeila do blau” (o imã amarelo na cadeira azul)

Teremos um longo dia pela frente :)

Luiza descobriu que os ímãs colam na cadeira
Luiza descobriu que os ímãs colam na cadeira
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Minha Bolha

Eu não diria que choro de saudade. Sou chorona, mas o que dispara meu choro normalmente é a lindeza, não o sorfimento. Eu chorei por diversas vezes desde que pus meus pés em Berlim e, confesso que, na maioria das vezes, o motivo era uma luz dourada batendo num prédio bonito, uma cena cheia de humanidade ou o desenho do horizonte harmonizando com o céu.

Por herança espiritual ou criação (ou por nenhum motivo) eu nunca fui daquelas pessoas que antes da terceira cerveja beija/abraça/distribui contato físico aleatoriamente sem constrangimento. As pessoas precisavam de um certo status na minha cabeça pra invadirem a bolha que delineava meu espaço físico. Ironicamente eu fiz muitos amigos explicando/satirizando minha Teoria da Bolha no fim dos anos 90 e início dos anos 2000.

Com isso, por anos tive a percepção de que não gostava de gente – que na verdade é de longe o meu maior interesse. Levei um bom tempo entendendo que cada coisa é uma coisa e passei a me expressar melhor – e melhor ainda por escrito. Meus abraços existem, são ótimos e os distribuo às pessoas mais queridas do meu mundo.

Eu acredito na capacidade de resiliência das pessoas e, de certo modo, na reprogramação que podemos fazer ao buscarmos novos significados para as sensações de sempre. Não desmereço nenhuma dor e acho que toda ressignificação real acontece de forma gradativa; com entendimento, aceitação, busca interna e por fim a vivência (ou Entrego-Confio-Aceito-Agradeço). Vejam que, quando enumero o processo, não tenho nenhuma propriedade para instaurar tais etapas como verdade. É uma mera análise do que minha terapia me ensinou e como eu consigo lidar com as adversidades automaticamente hoje em dia.

Quando sinto saudade e meus olhos se enchem de lágrimas eu foco na percepção de que é um privilégio poder estar aqui do outro lado do Atlântico, com mil planos e no meio de tanta coisa nova pra aprender e me inspirar. No fim sinto gratidão por ter gente tão querida que me deixa marcas tão positivas na existência e dou um sorriso. Em poucas ocasiões a angústia veio, mas foi assim que a mandei embora… com amor.

Já disse disse que temos sofá cama? Aguardando visitas e abraços.

Desse jeito
Desse jeito
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Vocabulário dos 23 meses

Eu venho fazendo notas mentais das maravilhas que Luiza diz, porém já faz um tempo que ela tem muita propriedade pra dizer o que quer, e a dicção está cada dia mais “adulta” (o que é engraçado pelo tamanico dela e meio triste pois ela raramente solta um termo bebezento). Sendo assim, por escrito perde toda a graça; não tem como demonstrar a entonação, a pequenez da voz nem os trejeitinhos.

Enfim nos últimos dias, talvez pelo excesso de informação que ela vem recebendo, o cérebro da pequena começou a dar uns nós. Daí eu penso: agora sim temos conteúdo pra um post, haha.

Luiza tem confundido a palavra consegui com consertei. Com isso ela tenta subir em algo e fala “eu não conserto”. Termina um quebra cabeça e fala “eu consertei” – o que faz todo o sentido do mundo. E quando o pai põe pilha em algo ela fala que ele consegou.

“Tá” e “Já” também estão dando trabalho. “Eu tá acordei, mamãe”. “O Bebel já dormindo, Golias já dormindo, Papai já dormindo…”.

Ela confunde a tia Joice com o George irmão da Peppa. Então vê a foto da tia e fala “tia George”. Essa semana encontramos a tia Ju e o tio Guigo, ela chegou em casa perguntando pela tia Gugu.

Eu a vi carregando uma sacola de mercado com estampa de gato. “Filha, onde você vai com a bolsa do gatinho?”. E ela responde “É sacola” (hahah). Outro dia ela queria perguntar sobre, mas esqueceu a palavra, daí disse “cadê aaaa… aaaa… aaaa… aaa… a caixa do gatinho?”. Sim, porque na sacola se guardam as coisas, assim como na caixa. Justíssima troca.

Até um dia desses ela dizia Dipuca quando queria falar desculpa. Agora é deculpa. Reconhece a letra U pra todo lado que vai, por conta do metrô daqui. Adora números, eu digo: “olha filha! Dois gatinhos!” e ela olha pros mesmos dois e diz “olha, quatro gatinhos!”. Papai fez dez anos, tia dinda tem quatro.

Essa noite ela estava um pouco febril e às 3h00 da manhã sentou na cama e disse “quelo ver Pocoyo na telesão” e ela mesmo respondeu “Telesão tá istagado. Não. Telesão tá dumindo, tá cansado… Papai tá cansado, Luiza tá cansado, a Galinha Pitadiha tá cansado… telesão tá cansado…”

A falação não pára durante o sono. Entre uma virada e outra ela balbucia coisas como “eu quelo dançar na sala”, “melancia”, “a bolinha lalanja caiu”, “cuidado Qua-qua!” e um quase que diário “papaiiiii? papaiiii?” seguido de nada.

Nós 3
Nós 3

Em menos de um mês completaremos 2 anos dessa viagem louca que é ser mãe/pai/filha. Ela nos encoraja e alegra todos os dias, nos dá novas perspectivas pra todos os olhares e ajuda a trazer paz pros nossos corações. Todos os dias. A gratidão só aumenta, o amor também.

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